A saga das lendas da Zara - Parte 1
Bom diaaaaa!!! Hoje é aquele dia que faz a gente acordar animadinho... Sexta-feira!!!Eu acordei animada pra falar e complementar um assunto que já toquei por aqui: consumo. Ontem beatifiquei minha musa DVF, mas mesmo gostando de falar, pesquisar, conhecer sobre moda, não me enquadro na categoria consumista shoppaholic. Deixa eu explicar:
Desde muito cedo, minha mãezinha colocou na minha cabeça e das minhas irmãs que consumo irresponsável era mal, que se importar com grifes era fútil, que dar vida longa e útil as roupas, sendo reciclando ou customizando, era o melhor. Vale lembrar que vivíamos nesse tempo bem apuradas com dinheiro, mamãe penhorava todas as poucas jóias que tinha para nos proporcionar um natal gordo (Porque natal, pra maioria dos brasileiros é puro presente, viu! Vergonha alheia, mas é. Religiosidade passa bem longe). Íamos a uma pequena cidade no interior do Rio de Janeiro, para comprar roupas mais baratas em lojas de fábrica e pontas de estoque, e naquele tempo as roupas duravam o ano todo...
Mas bastou nossas vidas melhorarem um pouquinho financeiramente, abriram-se as comportas. Viramos todas consumistas de mão cheia, gostou, comprou. Sem se importar com valor ou necessidade. Era uma espécie de dependência química, um vício mesmo. A sensação passageira de uma boa compra faz desvanecer todos os problemas emocionais. Mas pra mim sempre ficou a parte da culpa, eu que sempre fui de questionar tudo, me importar com o futuro daquilo tudo... Mas enquanto passei muitos anos vivendo na dinâmica da minha família, não me importei com isso. Até quando resolvi viver sozinha, ganhar meu dinheiro. Queria continuar a manter o padrão de vida que tive toda a minha adolescência, de fartura de carinho em forma de compras, onde eu massageava o meu ego tendo todas as coisas que a maioria dos meus amigos e colegas desejavam. Claro que a queda foi grande, mas ao invés de me sentir infeliz por não ter mais poder de compra, comecei a buscar alternativas.
Os brechós, lojas que compram e vendem artigos de segunda mão, são super populares no Brasil. E nos últimos dez anos, algumas descobriram a bola da vez, inspiradas nas francesas: especializar-se em marcas famosas e outras populares, como a Zara. Entrei no mundo das vendas de segunda mão e saí de mãos cheias, vendi 60% do meu armário dessa forma. Quando morei no Chile, estava voltando ao meu status de mulher depois de um longo tempo a ser mãe full time, e voltei às compras. Descobrí que lá as roupas de brechós vem de fardos enviados dos EUA, frutos de doação (???) e espólios, que são comprados por uma grande empresa que seleciona e repassa essas roupas para uma cadeia de lojas de segunda mão (quem conhece Santiago, já foi a Calle Bandera, sabe do que estou falando). Garimpando nessas lojas, encontrei muitos tesouros. Depois que soube da procedência, fiquei um pouco confusa e me dediquei as vendas online. Era muito divertido, as vendedoras vendiam coisas do seu próprio acervo, tudo muito amador, nos encontrávamos em estações de metrô para fazer nossos acordos comerciais, e nasceram até amizades desses encontros.
Vim morar em Portugal, e meu bichinho da compra se soltou um pouco mais, e vi que os brechós aqui são bem escassos e mais direcionados para consumo de luxo, ou feiras mesmo, com artigos vintage ou outros que não se daria nem um euro por ele, e também os grupos de "vendedoras" no facebook. Nesse eu me senti mais à vontade e me aventurei novamente, a colocar peças por preços camaradas, afinal meu intuito não é superfaturar nada pra lucrar. Sou bem honesta com o valor das minhas coisas, sei que algo muito usado apesar de conservado, não pode ser valorado nem pela metade do que paguei por ele. Há uma matemática nisso tudo: Se comprei uma blusa, por exemplo e paguei 50€ por ela, se a usar 10 vezes, digo que ela teve uma vida útil excelente, valeu-se 5€ por cada uso. E posso usá-la por mais X vezes, um dia que quiser vendê-la, não posso me dar ao luxo de cobrar mais do que 5€ por ela. Esse é meu cálculo da honestidade pessoal. Posso também doá-la, como faço na maioria das vezes.
Tudo isso funcionou lindamente até o dia em que percebi que a matemática da honestidade nos grupos era bem diferente... Dependendo da peça, se esgotou nas lojas, não importa o uso e condições do produto, a procura faz com que o ele passe a valer o mesmo valor pago ou até muito mais. Sem aceitação de reembolso ou devolução, e com direito a desaforos. Aí uma amiga, obcecada com uma sandália de coleção antiga da Zara, comprou uma "semi-nova" pelo preço de loja e teve uma surpresa quando a recebeu. Estava destruída, as fotos divulgadas tinham sido ardilosamente calculadas para esconder os estragos. Prejuízo.
E minha saga começou por isso:
Resolvi muito tarde que queria o casaco da Zara, que depois de ser elogiado pela Leandra Medine do Man Reppeler, virou uma obsessão e esgotou em todas as Zaras do mundo! Custava em loja 39,95€, e haviam vendedoras no e-bay a cobrar preço inicial de 200€! Não cedi a tentação e quando estava quase a desistir, caiu no meu colo uma alma caridosa que me vendeu pelo preço de loja. Me chegou em boas condições, mas fiquei com aquele sentimento de culpa enrascado na garganta. Tá ficando longo demais isso aqui, mas escrevi isso tudo pra fazer todos pensarem no tempo e energia que dispensamos com esse assunto. Blogueiras postam roupas e no mesmo minuto todos estão a buscar de onde é e correndo pra comprar, sem pensar. Elevação do status da Zara, que é uma fast fashion, exploradora de trabalho escravo como outras tantas, para o nível de roupa de luxo. Existem mulheres que compram quase todos os lançamentos, usam uma vez (às vezes muito mais) tiram fotinhos felizes, e põem as peças para venda pelo dobro do preço, porque já esgotaram! E vendem. Roupa virou troféu. A história do must have elevada ao grau patológico. Quando sair da sua boca "eu tenho que comprar, eu preciso" sobre algum item da Zara, desconfie. Você não precisa, seu armário já deve ter coisas com melhor qualidade e na mesma cor e modelo. Caia fora!
Eu como conselheira fashion, quando abro o armário e me deparo com aquele casaco, me vem a culpa como pontada na consciência. E todas as roupas que comprei por impulso também me saltam aos olhos pedindo um "o que eu faço com isso?" Edição rehab.
Esse top de lantejoulas da Zara bendita, estou a tentar vender pelo mesmo preço de loja, usei somente uma vez, comprei por um tremendo impulso, provei do meu próprio veneno. Publiquei no OLX e há uma menina, blogueira, high society, que está a me questionar e atacar porque estou a vender pelo preço de loja algo usado. Detalhe: ela também faz parte de grupos de revenda. Abafa o caso.
Toda a justificação e apologia é pra dar a mensagem de sermos responsáveis. A maioria das blogueiras e revistas influentes estão aí pra mostrar o que eles são pagos para fazer. A informação nos chega muito rápida, e o resultado que vemos são meninas que ganham pouco e gastam tudo o que tem com o vício das compras. Pare e pense mil vezes na necessidade e no valor real, quando for comprar algo. E sempre que comprar, retire outra peça do armário e ponha para doar ou qualquer outro fim, é um bom despertar à consciência e faz bem à natureza.
Provar que és mais forte que seus próprios desejos, o exercício de hoje em diante. beijinhos e um bom fim de semana, sem shopping, combinado?
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